terça-feira, 28 de novembro de 2017

Amoite de Brasília


O subsolo tem vida, tem rotina
Ainda que com tempo escondido da luz do dia, desenfreado, de correria
Há nele pedaços de luz, de música, poesia, calmaria
Há nele um pouco de vida e ocupações distintas,
Frases soltas, aos pedaços, búzios, caminhos, cangaços,
Lugares de passagem, mas também de abrigo a pessoas famintas
Há nele abandono,
Há verdades do cotidiano, palavras ao vento, pessoas ao relento
Olhares ansiosos, passos apressados,
Túneis inteiros de pensamentos:
“Liberdade! Libete-se! Priorize as prioridades!
Nua, de mim
Teu consumo te consome
A vida é sonho
Viva antes de morrer
O poder do espirito santo é a nossa força, sem ele ninguém tem a paz
As ruas falam-me
Legião urbana
Procuro namorado gostozo
Dayane buzios e tarot, faz amarração p/ o amor
A saudade é o pior tormento, é pior que o esquecimento”
Há apropriação de espaços vazios,
Que se enchem de história, de gente, de arte
De festa, de vida e movimento por toda parte
Há gente que canta, que vende, que compra, que corre, que anda, que perpassa, que manda e desmanda na massa, que dorme, escassa, que chora, que vive, que mal consegue ver por onde passa
Há gente que se arrisca, que petisca, que tem medo, coragem, malícia, milícia
Há quem trabalha duro, gente honesta, doméstica, advogado, artista
Há espaços transformados,
Com trajetórias novas e projetos atravessados
Espaços apropriados, de ocupação,
Com novos usos de uma cidade tombada que cresce pelo ladrão
Há nele pessoas, carros, passagens, lugares, não lugares
Há monumentos disfarçados de esculturas no horizonte
Com subsolos inteiros que os fazem singulares
Há no subsolo reserva, dinheiro
Um banco central inteiro
Que cresce de baixo pra cima
Um subsolo restrito, de acesso restrito
Bem mais restrito do que se estima
Há, ainda, galerias pintadas,
Athos, fatos, anonimatos
Painéis desconhecidos, obras de arte renomadas
Há um mundo à parte que se inicia, mas não se encerra
Pois se até o sol se esconde na noite,
Brasília também busca seu amoite,
E renasce a cada dia debaixo da terra.

Daniela Dino

quinta-feira, 5 de outubro de 2017

Luar

(Para ler rápido e perder o folêgo, do mesmo jeito como a lua invadiu o céu de hoje, roubando meu ar, meu amar, meu luar).
Chega calada, 
enquanto o dia termina,
sem alarde,
desatina,
e de repente invade
esse céu que incendeia,
roubando olhares,
em cada esquina,
a noite clara de lua cheia.
Dona das águas,
das estrelas,
do bumba-meu-boi,
do mar,
da gravidade que seduz ondas,
de minha retina,
meus olhares,
marejados,
de hoje,
de quando menina,
que refletem
sendo acaso,
destino,
ou sina,
para amar,
a quem se destina,
o brilho dourado,
prateado,
cor de mina,
de mil e uma noites de clarão de luar.

Daniela Dino

quarta-feira, 21 de junho de 2017

Alvorada de um beija-flor

Amanhecem os dias mais claros
Um outono amarelado
Uma alvorada feita de sorrisos 
De cor
De cor e salteado
Onde todo ar parece pouco
Por ser tão leve
O soar do vento
(do tempo)
Desperta meu timbre rouco:
[...]
Se pássaro for
Por onde flor
Me beija-amor.
[...]
Eis a alvorada de um beija-flor.
🌻 Um beija-flor invadiu minha casa e fez de mim alvorada, intensa, amarelada...

 Daniela Dino 

sexta-feira, 21 de abril de 2017

Relicário

Minha Brasília amarela
E de todas as cores
[Mutante]
Meu ponto de fuga do imaginário.Aquarela de céu abertoE de cerrado de flores[Radiante]Minha arquitetura, meu relicário.

Daniela Dino

terça-feira, 14 de fevereiro de 2017

5 anos de saudade (e lembranças)

Me lembro bem do teu rosto
Das tuas covinhas, do teu gosto
Lembro dos teus sonhos, lembro dos teus medos
Lembro do peso leve, da tua leveza, até da voz eu lembro
Era suave, voz de anjo
Lembro do teu jeito de sentar à mesa
Das tuas brincadeiras e provocações de defesa
Lembro das tuas roupas, tua vaidade
De quando nem parecia ter diferença de idade
Lembro do teu grito, das tuas cicatrizes e feridas
Lembro de todas tuas comidas preferidas
Lembro do teu jeito menino, das tuas frescuras,
Lembro da porta do banheiro entreaberta em noites escuras
Lembro da tua preguiça, da tua timidez
Lembro das parcerias em duplas de xadrez
Lembro do teu carinho, teu jeito quieto
E da tua maneira de demonstrar afeto
Lembro da tua corrida pro mar
Lembro dos teus passos, teu jeito de andar
Lembro do teu cabelo, da tua cor
Lembro de te procurar por onde for
Lembro de todos os dias
Da nostalgia solta no ar
Lembro de ti todos os dias
E da saudade que me faz de ti lembrar
-
Não tem um dia que não me lembre de ti de alguma forma... Tu estás em tudo de lindo nesse mundo, em cada detalhe, em cada força e pensamento. És meu pedaço de céu, meu anjo protetor, meu telinho!

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2017

João


João, ainda no colégio,
já quase entendia como a vida funcionava
Não que a compreendesse realmente (e alguém já a compreendeu?)
Mas porque desconfiava,
sabia que a ordem não era assim tão natural
Porque era curioso, suas perguntas despertavam um sentimento confuso
Assim,
Meio de admiração,
meio de perplexidade.
"Fica quieto, João!
senão chamo a diretora!"
Ele se chateava.
Mas porque era vívido,
logo estava fazendo alguém sorrir
E porque era antídoto,
esse sorriso logo se misturava com o seu
Não esquecia aquele cínico.
"Por que o professor não me respondeu?"
Mas porque era único,
sabia que um dia ele alcançava
E se tinha dúvida,
sabia que ia descobrir por si só.
João - isso ele ainda não sabia -
tinha muito privilégio
Não tinha lá muita coisa pro almoço
Nem tinha bola, ou violão (essas coisas de menino de escola)
Mas João tinha amor
E, porque amava, vivia
Era feito de memórias e ausências vestidas
Tinha saudades que nem mesmo conhecia
E sonhava com amores, não camas vazias
João questionava cada coração calado
Mas, sendo assim, também era questionado
"João, e as namoradinhas?"
Em qualquer canto, sempre tem aquela tia
João tinha várias, sem respostas - nem pra suas próprias questões ele tinha
Mas o porquê do plural ele não entendia
João não queria várias, nem inhas
Queria alguém que acompanhasse suas dúvidas
E o instigasse com a curiosidade que ele tem por um olhar arraigado
Ou por aqueles efêmeros, que fogem do encontro,
sem rumo ou qualquer nitidez.
"Que graça que vê nisso? Bora zuar!"
Ele ria.
Perdia menos energia assim,
que tentando levar à juventude
o que, há tempos, se perdeu por aí
Ria pra não ter que lidar com dissabor
Ou com a falta de virtude
daqueles que não vêm amor em olhares e abismos
Abismos de amor mesmo, ele dizia
João gostava de aventura
Não se prendia ao chão porque liberdade é voar
Sempre achou muito óbvio andar por linhas retas
E gostava da vertigem que dava a sinuosidade das curvas
Era desafiador, não gostava de andar em círculos
E sempre fechou ciclos
João era começo e recomeço
De erros que se erguem em futuros acertos
De libertinagem que insistia em perturbar
"João, tu perdeste o juízo?"
João nunca teve.
Mas o que mais importa nele há:
Vida e pão.
Tinha muito privilégio, não sabia.
Correu no abismo e voou.
"Volta, João!"
Calma...
Um dia ele volta Sabiá.

Daniela Dino e Tiago Dâmaso

(Primeiro poema em parceria, de muitas parcerias que virão dessa dupla)

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2017

Ansiedade não tem métrica


É tão difícil
abrir os olhos
Quando sequer
consegues fechá-los
para dormir
Não tem padrão
Não tem métrica
Mal respiras
Às vezes meditas
Tens insônias esquisitas
[...]
A ansiedade
te torna futuro
Quando na verdade
estás aqui.
--
Aos ansiosos de plantão, do século e da nossa geração! Que possamos entender que "estar aqui" é preciso, saber abrir e fechar os olhos também

Daniela Dino

domingo, 22 de janeiro de 2017

Menina nordestina


Esse meu jeito de menina
É da minha alma feminina
E meu q de nordestina
De ser plural onde quiser
Essa minha busca desatina
É de uma ânsia repentina
De fazer jus a minha sina
E ser criança em uma mulher.

Daniela Dino